segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

ANTÓNIO FONTES - Causas e Casos de um Padre Barrosão

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Paginação: Luís Teixeira

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7 comentários:

  1. BIOGRAFIA DO PADRE FONTES

    Das ervas à bruxaria
    Montalegre
    Uma escola aberta a toda a mentira e a toda a verdade
    Vendem-se quilos e quilos de chás para todos os males,
    pomadas milagrosas e mezinhas que tudo curam. Por cinco Euros e em cinco minutos promete-se acabar com o seu sofrimento. Acredite quem quiser...
    Vilar de Perdizes fica lá bem no cimo do nosso país, paredes meias com a Galiza, região do Barroso no sopé da Serra do Larouco e assim como Tourém, Meixedo, Gralhas e outras aldeias, do concelho de Montalegre também é Portugal. Graças aos Congressos de Medicina Popular, Vilar de Perdizes uma freguesia de 400 fogos e 500 habitantes, saiu do anonimato, tem honras televisivas, nas nossas televisões e nas espanholas e, é notícia em muito jornal e revista.
    Uma vez por ano, e já lá vão 16 edições, esta aldeia, durante três dias recebe milhares de visitantes, médicos, naturistas, osteropatas, bruxos e adivinhos, ilusionistas e especialistas em curas espirituais, especialistas em terapias de vidas passadas, endireitas, cartomantes, ervanários.
    Durante estes três dias, vendem-se quilos e
    quilos de chás para todo o mal, pomadas milagrosas, recebem-se massagens, e ouvem-se as palestras num misto de especialistas de medicinas alternativas, juntamente com especialistas de doenças da mente e do
    espírito.
    Vilar de Perdizes é o local por excelência onde tudo é permitido e que segundo o Padre António Fontes um dos dinamizadores do evento, este Congresso é \" uma escola aberta a toda a mentira e a toda a verdade\".
    Falar de Vilar de Perdizes obrigatoriamente é falar deste padre, homem por vezes controverso, um defensor acérrimo desta região, que ele tanto ama. E para falar do Padre Fontes temos que recuar um pouco no tempo

    CONTINUA

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  2. O Padre António Fontes, nasceu em Cambezes do Rio, uma aldeia do Barroso, próxima do Rio Cávado, em 22 de Fevereiro de 1940, seu pai esteve emigrado na América, no longínquo ano de 1927, e teve doze filhos. Ingressou no Seminário em Vila Real, em 1950, saiu em 1962 e diz \" o Seminário ocupou quase toda a minha juventude, não se conta em duas palavras, foi demasiado tempo. E esse fica, deixa marcas vincadas como as negras batinas dos padres que por ali se moviam. Alguns poucos quase santos, outros, talvez a maior parte, mais que diabos\".


    Desde pequeno que sempre disse que queira ser padre, e aos 10 anos, escola primária feita, já estava no Seminário. \" Enquanto andei no Seminário, meus pais, sabe Deus como, viram-se aflitos para suportar aquela despesa. Na agricultura ninguém tinha salário e todos os trimestres era necessário pagar. Quando não havia a quantia necessária, pedíamos dinheiro aos vizinhos ou vendíamos qualquer coisa\".


    Foi ordenado em 1963, e foi colocado em Tourém, aí esteve oito anos. Deixou a sua marca nesta terra, paredes meias com a Serra do Gerês e com a Espanha, mais com a Espanha que com Portugal. O seu meio de transporte, um cavalo, atendendo a que não havia estradas dignas desse nome, servia-lhe para ir de para as paróquias celebrar a missa. Em Tourém criou uma escola, iniciou cursos agrícolas, cursos de bordadura, requisitou leite, farinha, manteiga e óleo à Caritas, começou por dar as refeições confeccionadas na casa paroquial, onde vivia com uma irmã, já que se desse os alimentos, alguns vendiam-nos. O seu nome começou a ficar pelas aldeias, que percorria no seu cavalo, ia celebrar missa a Pitões das Júnias e Covelães. Ao fim de dois anos o seu meio de transporte muar foi substituído por uma motorizada. Deixou Tourém em 1971 e foi para Vilar de Perdizes, já lá vão 32 anos. Para além desta paróquia têm a seu cargo Mexide e Soutelinho da Raia. Todos os dias celebra missa em Vilar de Perdizes às oito e meia da manhã.

    \"Mudei de local, não mudei de gente. Tourém ficou sem padre propus, com mais 12 párocos, uma forma rotativa de, um em cada mês, ir à aldeia celebrar aos Domingos a Eucaristia, para manter viva a paróquia\" e continua \"estou ao serviço das pessoas nos locais onde permaneço e caminho.

    CONTINUA

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  3. Nunca exigi nada em troca. Faço o que me pedem com generosidade e nunca me senti obrigado a nada. Faço parte da crença das gentes, por isso não marco a ferro a minha religião. Estou perto das pessoas, faço parte delas e tento aproximá-las da minha fé e mensagem que quero transmitir. Os inícios da vida de um padre marcam. Talvez a minha fosse diferente se tivesse ido para Roma quando acabei o Seminário. Nessa altura queria continuara a estudar e pedi ao bispo que me desse essa oportunidade. Ele na sua simpatia, chegou à conclusão que alguém iria para a capital italiana. Mas não eu. Escolheu alguém mais inteligente, mais estudioso e, como havia só lugar para um, fiquei em Barroso\".

    De 1975 a 1980 frequentou a Faculdade de Letras da Universidade do Porto , inscrevendo-se em História. Terminado o curso um Professor convida-o para ficar a dar aulas de Etnografia no Porto, mas sempre rápido e decidido dá logo a resposta \" o Porto sem mim cresce e a a minha terra, sem mim, míngua\".


    Feitas as apresentações, que dariam para escrever um vasto livro, e há livros sobre o Padre Fontes, encontramos este homem não na mesa do Congresso como se esperava, mas entre a multidão na assistência.


    Procurado nos intervalos por todos os jornalistas, por todas as televisões, que nestes dias assentam praça, em Vilar de Perdizes. Reparo que o povo da aldeia, já não liga a estas tecnologias de carros de exteriores, com grandes parabólicas, emaranhados de fios, tripés muitas câmaras, repórteres em acção, olhando o relógio, à espera de entrarem nos directos nos telejornais. Já ninguém liga, pois já são 16 eventos (2002)e estão habituados. O padre António Fontes tem sempre tempo para a Comunicação Social, habituado a falar, comunicador por excelência, responde sem hesitar às inúmeras questões e começa por nos falar dos Congressos. Tem a palavra o Padre Fontes.


    M. P.- Padre Fontes como e porquê nasceram estes Congressos de Medicina Popular?

    A. F. - Os Congressos de medicina popular nasceram depois de ter registado, inventariado, escrito algumas coisas sobre medicina popular, num livro que escrevi e com o título de, \"Crenças e Tradições de Barroso\". Recolhi grande parte da matéria do livro que se baseava na magia, na superstição, nos curandeiros na aldeia de Tourém.
    CONTINUA

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  4. Na década de 70, quando vim para Vilar de Perdizes, começaram a chegar médicos para todo o concelho de Montalegre, abriam-se as Casas do Povo, e esse valor cultural de uma medicina popular que sempre susteve este mundo, começou a cair nas práticas ditas científicas. Pensei na necessidade de chamar a atenção para o valor do que estava criado, das tradições, da cultura, das formas existentes de cura, e, em 1983, foi realizado o primeiro Congresso. Um êxito. As pessoas pediram repetição. Era uma ideia interessante, algo que não existia. No fundo, o primeiro Congresso foi uma reunião de pessoas com objectivos de discussão de determinados objectivos esquecidos no país. Aliado aos congressos existia a vontade de desenvolvimento da região. Como não havia alojamentos pedi às pessoas para oferecerem alojamento aos que vinham de fora . Para além do Congresso, sempre houve a intenção de mostrar a região e as suas potencialidades turísticas nas vertentes cultural, paisagística, gastronómica. Durante os congressos tentei organizar os restaurantes de forma a que servissem pratos regionais em função dos dias do evento. Nos congressos os congressistas vem exercer a medicina deles. A medicina popular é natural para a região e para o meio. Aqui em Vilar das Perdizes, há médico duas vezes por semana. Dizem as pessoas que não é para todas as doenças. Há males que não são do médico. Sei que o problema é criado pelos médicos, pois não ouvem as pessoas, não têm tempo. Talvez seja de tempo e atenção, algum carinho, que os pacientes necessitem.
    M. P. Para o povo de Vilar, os congressos servem para divulgar a região e a terra. O senhor como dinamizador, conseguiu por esta via, meter a aldeia no nosso mapa, já que estamos numa região tão bonita, mas um pouco esquecida.
    P. F. Este extremo norte de Portugal quase não existia. era Chaves, Montalegre e agora já se começa a ter um mapa mais detalhado. Já há mais caminhos, antigamente não havia caminhos. Não há auto estradas, ainda não conseguimos por no mapa das auto- estradas Vilar de Perdizes. O país real começa no Algarve e chega aqui, não é Porto, Lisboa e o resto é paisagem. Agora a paisagem começa aqui e quem quiser conhecer o país real, tem que sair do seu litoral e chegar aqui à montanha, aos pés do Larouco e descobrir, o encanto mágico atraente, cultural, paisagístico, social, religioso, que é Vilar de Perdizes.
    M.P. O senhor é um defensor da sua terra, da sua região do seu povo, das suas origens. Considera-se um lutador?
    P.F. Agora estou a querer fazer-me em arauto do mundo rural. Na medida em que ele está acabar, estou a pedir socorro e isto é uma espécie de injecção do mundo rural e das capacidades que o mundo rural tem. Não é apenas Vilar de Perdizes que pode ter isto. Qualquer aldeia do interior, do Minho, do Algarve, do Alentejo ou do Ribatejo pode ter a mesma coisa que aqui temos e sair do anonimato e pôr-se no mapa.

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  5. M. P. Mas não há muitos mais padres Fontes...
    P. F.- Bem realmente isso tem alguns dessasosegos, alguma falta de privacidade, mas tudo isso é saudável quando alguém beneficia, sobretudo o mundo esquecido, e marginalizado, que hoje fala e tem voz, através da Comunicação Social, através da gente que aqui vem, e que, satisfaz uma curiosidade justa e agradável de descobrir o que é a erva natural , os valores, os cheiros e aromas das ervas do chás, descobri-las, usá-las e levá-las para casa e desintoxicar-se com o ar puro que aqui se respira, com a alimentação agradável que aqui é saborosíssima, com a água límpisima que aqui se bebe, com o ambiente sossegado de pessoas, tranquilas à procura do sagrado, do mítico, do religioso, à procura do naturista, e à procura também do ilusório, do mágico do supersticioso.
    M. P. Que faz parte também da nossa vida e da nossa cultura
    P:F.- A cultura portuguesa , celta um místico de Africo-Brasileiro e Nórdico e isso está na raiz e no sangue de todo o português.
    M.P. Pensei encontrar o Padre Fontes na mesa do Congresso, dirigindo, organizando, conduzindo o evento que criou. Vejo-o porém na assistência, no meio das centenas de pessoas que assistem. A hierarquia da Igreja Católica, não vê com bons olhos esta sua envolvência?
    P. F.- Bom disseram-me para não organizar e eu desorganizo. Não organizo, desorganizo. Isto é imparável. O dia está marcado, daqui a um ano é a mesma história. Não é preciso dizer a ninguém que venha. Até dissemos que não venham. Isto é demasiado pequeno para quem queira vir cá. Mas repare não é bem a Igreja é o Bispo de Vila Real, e um Bispo só, não é a Igreja.
    M. P. E porquê?
    P.F. Pela mistura do sagrado com o profano, do religioso com o mítico, do bruxedo com a Igreja e um padre nisto parece-lhe confuso, e há muita pessoa que se confunde. Mas é bom ver e é preciso desmontar confusões não só à Igreja mas também às pessoas, para verem onde está um charlatão e ficarem a saber quem é ele ou verem onde pode estar a verdade, para ficarem a saber. O que se passa nesta data não é mais que uma descentralização do religioso pela medicina natural. Assentamos ainda muito no sagrado que não é virado para nenhuma entidade específica. É voltada apenas para a Divindade Máxima que é a fé das pessoas num Deus criador e potencialhumano de toda a gente.
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  6. Tornou-se numa atracção nacional pelo facto de não haver quem pegue neste tema por receio de mexer com coisas do oculto, medo da vingança dos demónios, dos espíritos e dos bruxos e videntes, das ameaças que essas pessoas podem fazer quando não são tratadas com delicadeza e humanismo.
    M. P. Mas desculpe-me é sabido que em tempos remotos eram os padres que praticavam o exorcismo. Ou ainda hoje se pratica.
    P. F. O novo Bispo de Vila Real D. Joaquim, não encarou bem o meu envolvimento no Congresso. Talvez por impressões ou pressões de gente menos bem intencionada, viu na minha actividade uma mistura de sagrado e supersticioso. Tentei fazer ver que isso não corresponde á verdade.
    Talvez, por não ter acreditado, pediu para me afastar da organização. Acedi ao seu pedido, embora participe no Congresso como um animador cultural e dou apoio às pessoas que aqui vêm. Mas o meu objectivo é o confronte de ideias, formas de estar, conhecimentos e tradições, que depois são postos em questão, em debate , em evidência.
    O público que aqui vem já não é parvo, felizmente que vai havendo evolução no conhecimento e descoberta dos truques de quem tenta enganar as pessoas com poderes, que nem sempre correspondem á realidade, com dons que não têm. Se não houvesse congresso, o charlatanismo seria maior, estaria mais encoberto e a comunicação social vai alertando que nem tudo o que acontece no Congresso é para engolir. Digo-lhe ainda que Medicina é aquilo que nos cura, o que previne a nossa saúde. Popular é tudo o que é à base do não científico, do não erudito, do tradicional, do caseiro, do amadorístico, da natureza.
    Contudo, há curandeiros que têm capacidade de curar. E não é por sugestão. Existe a cura pelas mãos, pelas palavras, pelos olhos, pelas massagens. Umas vezes melhor, outras vezes pior.
    Sobre os exorcismos. Toda a gente faz exorcismos. Exorcismo é um palavrão, que traduz o que antigamente seria tirar o diabo do corpo. Isso era exclusivo dos padres. Havia um ritual próprio, mas acho que a igreja acabou com os exorcismos há alguns anos, embora existam padres que os façam. Actualmente, o pseudo-exorcista é feito por qualquer curandeiro, qualquer pessoa pelos meios que conhece, e outros por imitação dos padres.

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  7. No fundo não é fazer exorcismo. É uma farsa, uma representação entre o actor e o espectador. Eu não acredito em bruxas, nem em feitiços, nem sequer no diabo.
    Não se pode ser padre numa região cheia de miséria e injustiça e ficar a olhar para o lado. É por isso que as gentes do Barroso nunca abandonaram o seu paganismo fundamental. O paganismo dava-lhes curas, mezinhas, vida comunitária, assistência na desgraça. E a igreja veio para aqui falar de cátedra, nunca entendeu estas gentes. Por isso nunca conseguiu fazê-las deixar de acreditar em bruxas e fantasmas. Eu farto-me de disser às pessoas que essas coisas não existem, estão dentro de nós, e até já me torneio conselheiro de muita gente que pensa que sou bruxo.
    M.P.- Falemos destas terras, desta região que vão perdendo as pessoas. Houve por aqui muita emigração?
    P.F.- Aqui foi das aldeias em que menos emigraram. Houve contrabando até 1992, quando acabou o contrabando com a abertura das fronteiras, houve emigração das pessoas para a Suíça, embora tivessem emigrado alguns para a Holanda, França, Alemanha, Brasil.
    M.P. E não estão a regressar?
    P.F. Alguns já vão vindo e eu estou a tentar criar o mito de Vilar de Perdizes para que eles voltem. É raro o emigrante que aqui não faça uma casa nova.
    M.P. E quanto a juventude, tem muitas crianças.
    P.F. Isso é que é pior. São dez crianças para quatro salas de aula.
    M. P. Acredita que os Congressos não vão parar.
    P.F. Acho que não, é impossível parar, parar é morrer. O mesmo é útil para quem vêm e, e faz \"esticar o país\" o país chega até aqui.
    M.P. Mesmo que os telemóveis só apanhem a rede espanhola...
    P.F. Sim mesmo apanhando a rede espanhola, estamos em Portugal
    M. P. Não quer mandar uma mensagem para as suas gentes emigradas e que leiam este jornal?
    P.F. Gosto que vivam na sua terra de origem e que deixem essas terras de escravatura, que embora lá se viva bem, o nosso país é sempre a nossa pátria, a nossa língua é sempre a nossa língua, as nossas tradições é sempre a nossa identidade e já se vive bem em Portugal.
    MPortuguês, 2002-09-23
    De diariodetrasosmontes.com

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